Trump demite a membro do Federal Reserve, Lisa Cook, gerando controvérsia legal e crise de independência do Fed

O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, anunciou em 25 de agosto de 2025 a demissão imediata da membro do Federal Reserve (Fed), Lisa Cook, sendo esta a primeira vez na história dos EUA que um presidente em exercício toma tal atitude. A decisão foi anunciada por meio de uma carta publicada por Trump em sua plataforma de mídia social, Truth Social, citando os poderes conferidos pelo Artigo II da Constituição dos EUA e pela Lei do Federal Reserve de 1913, declarando que a demissão de Lisa Cook teria efeito imediato. Esta ação não só intensificou a pressão de Trump sobre o Fed, como também pode desencadear uma importante disputa legal sobre a independência do Federal Reserve.

Motivo da acusação: controvérsia sobre fraude hipotecária

A decisão de Trump de demitir Lisa Cook teve origem em acusações de suposta fraude hipotecária. Alega-se que, em 2021, Lisa Cook declarou duas propriedades, localizadas em Michigan e na Geórgia, como residência principal ao solicitar hipotecas para ambas, com o objetivo de obter condições de empréstimo mais favoráveis. Bill Pulte, diretor da Federal Housing Finance Agency (FHFA), tornou públicas as acusações de fraude contra Lisa Cook em 20 de agosto nas redes sociais, e posteriormente encaminhou uma denúncia criminal ao Departamento de Justiça. Pulte é um aliado fiel de Trump e crítico de longa data do presidente do Fed, Jerome Powell.

Trump respondeu rapidamente às acusações de Pulte, exigindo no mesmo dia, via Truth Social, que Lisa Cook “renunciasse imediatamente”. Em sua carta, ele escreveu: “Há motivos suficientes para acreditar que você fez declarações falsas em vários contratos de hipoteca. Você assinou um documento atestando que uma propriedade em Michigan seria sua residência principal no próximo ano, mas duas semanas depois assinou outro documento declarando que uma propriedade na Geórgia seria sua residência principal.”

Lisa Cook negou veementemente as acusações e afirmou que não renunciaria devido a “algumas dúvidas nas redes sociais”. Em sua declaração, disse: “Não pretendo ser intimidada a abandonar meu cargo. Levarei a sério quaisquer questões sobre meu histórico financeiro e estou reunindo informações precisas para responder a qualquer dúvida legítima e fornecer os fatos.” No entanto, Trump não aguardou o processo judicial ou uma decisão do tribunal, anunciando sua demissão diretamente em 25 de agosto.

Disputa legal: o presidente tem o direito de demitir membros do Fed?

De acordo com a Lei do Federal Reserve, o presidente só pode demitir membros do Fed por “justa causa” (for cause), mas a lei não define claramente o que constitui “justa causa”. Tradicionalmente, isso é interpretado como má conduta criminal ou falha no cumprimento dos deveres. Especialistas jurídicos disseram ao The New York Times que Lisa Cook ainda não foi formalmente acusada ou condenada, portanto, a decisão de Trump pode enfrentar desafios legais. Caso o tribunal permita que Lisa Cook continue trabalhando durante o processo, o caso pode até chegar à Suprema Corte.

O advogado de Lisa Cook, Abbe David Lowell, declarou: “O presidente Trump alega que me demitiu ‘por justa causa’, mas não existe qualquer motivo legal para isso, e ele não tem autoridade para fazê-lo. Não renunciarei e continuarei a cumprir minhas funções, servindo à economia dos EUA.” O episódio é visto como a mais recente tentativa de Trump de enfraquecer a independência do Fed, podendo ter impacto profundo na confiança no sistema financeiro dos EUA.

A estratégia de Trump para remodelar o Fed

Lisa Cook é a primeira mulher negra a servir como membro do Fed, tendo sido indicada pelo ex-presidente Joe Biden em 2022, com mandato previsto até 2038. Se Trump vencer a disputa judicial, terá a oportunidade de indicar outro membro para o Fed, fortalecendo ainda mais seu controle sobre a instituição. Atualmente, entre os sete membros do conselho do Fed, dois — Christopher Waller e Michelle Bowman — foram nomeados por Trump durante seu primeiro mandato. Além disso, no início deste ano, outra indicada de Biden, Adriana Kugler, renunciou repentinamente, abrindo espaço para que Trump indicasse Stephen Miran, presidente do Conselho de Assessores Econômicos, para preencher a vaga.

Se Trump conseguir indicar dois novos membros, controlará a maioria das cadeiras do conselho do Fed, influenciando profundamente a política monetária. Trump tem criticado o Fed por não reduzir rapidamente as taxas de juros e atacou publicamente o presidente do Fed, Jerome Powell, mesmo tendo sido ele próprio quem o indicou ao cargo em 2017. Trump chegou a ameaçar demitir Powell antes do término de seu mandato em maio de 2026.

Resposta do Fed e crise de independência

No simpósio de Jackson Hole em 22 de agosto, Powell afirmou que o Fed pode reduzir as taxas de juros quando necessário, mas que agirá com “cautela”. Essa declaração demonstra que o Fed tenta manter sua independência diante da pressão de Trump. No entanto, a ação de demissão de Trump levou o limite entre o poder presidencial e a independência do Fed a um nível de tensão sem precedentes.

A senadora Elizabeth Warren comentou: “A tentativa ilegal de Trump de demitir Lisa Cook é o mais recente exemplo de sua busca por um bode expiatório para encobrir seu fracasso em reduzir o custo de vida dos americanos. Trata-se de uma apropriação autoritária de poder em flagrante violação da Lei do Federal Reserve, que deve ser revertida nos tribunais.” O mercado também reagiu ao evento: o índice do dólar caiu 0,3%, os futuros das bolsas recuaram e o preço do ouro, como ativo de refúgio, subiu 0,45%.

Perspectivas futuras

O caso da demissão de Lisa Cook marca não apenas uma intervenção sem precedentes de Trump no Fed, mas também pode ter efeitos duradouros sobre a independência do banco central dos EUA. Se Trump conseguir remodelar o conselho do Fed, a política monetária poderá se inclinar mais para estímulos econômicos de curto prazo, em vez de estabilidade de preços e pleno emprego no longo prazo. No entanto, tal intervenção pode gerar incerteza nos mercados e prejudicar a confiança global no sistema financeiro dos EUA. Nos próximos meses, as decisões judiciais determinarão o rumo do caso e estabelecerão novos precedentes para os limites de poder entre o presidente e o Federal Reserve.