Líderes do mercado repercutem taxação das criptomoedas no Brasil

A medida provisória (MP), publicada na quarta-feira (11), impôs a taxa de 17,5%, no IR, para todos os ativos digitais, como o Bitcoin . Especialistas ouvidos pelo BeInCrypto Brasil dizem que a medida é controversa, sobretudo, por querer taxar um mercado antes de regular.

Apesar dos boatos sobre a inclusão ou não das criptomoedas na tentativa de aumentar o imposto sobre operações financeiras (IOF), os especialistas avaliam que essa taxação seja prematura. Sobretudo, porque o Banco Central ainda trabalha para apresentar as regras do segmento, com previsão para o segundo semestre de 2025.

Apesar de contrário a MP , CEO da Bipa, Luiz Parreira entende que a taxação pode sinalizar que a conclusão desse entrave institucional possa estar próxima.  De fato, a medida provisória passa a valer no calendário da Receita Federal a partir de 2026.

Prós e contra a taxação das criptos

“O principal ponto positivo é o reconhecimento fiscal, oficial, do criptoativo. Começamos a identificar que o próprio governo federal está identificando o criptoativo como relevante para o mercado”, diz o chief compliance & legal officer (CCLO) da Frente Corretora, Carlos Henrique.

Outro ponto relevante é inclusão das criptomoedas como forma de compensar ganhos e perdas em ativos financeiros dentro da declaração anual do Imposto de Renda. De fato, essa compensação pode ser feita em até três trimestres consecutivos. Porém, para Parreira, essa relação ente perdas e ganhos poderia incluir ativos tradicionais, como ações.

Se anteriormente o investidor de criptoativos estava subordinado a uma alíquota diferenciada, variando de 22,5% a 15%, agora há a alíquota de 17,5% para todos. Contudo, os pequenos e médios investidores foram os principais afetados pela medida por perderem a isenção do imposto de renda para investimentos em criptoativos de até R$35 mil.

“Essa é uma lógica semelhante àquela adotada em outros países após a aprovação da lei das offshores em 2024”, comenta Giovana Naya, sócia e head de Wealth Planning na Portfel. Nos Estados Unidos, o departamento financeiro de Nova York criou a BitLicense, uma tentativa de regulamentar as fintechs e startups no estado, antes de existir uma regulamentação nacional.

“É importante destacar que a Receita Federal está de olho não só nas exchanges nacionais, mas também nas estrangeiras e até nos ativos mantidos em carteiras autocustodiadas. De fato, o imposto incide sobre qualquer venda ou troca de criptoativos que resulte em ganho de capital”, comenta Naya.

O que pensa o mercado cripto sobre a taxação?

“Para o mercado conseguir atrair mais investidores, mais capital, fazer o dinheiro girar, ir para o Bitcoin e voltar para o real, vai ser ruim. Mas para o governo acaba sendo bom, porque vai conseguir capitar mais recursos”, diz Parreira. Na Bipa, o CEO comenta que novas estruturas terão que ser pensadas para ajudar os clientes com as futuras demandas, o que vai demandar investimento e tempo.

“A medida prejudica a expansão positiva do mercado no Brasil, onde o foco para melhorar o impacto social e econômico deveria ser a regulação e que deve ser prejudicada. O setor, junto ao trabalho positivo feito pelo Banco Central, não foi considerado pelo governo federal”, afirma a Regina Pedrosa, presidente executiva da ABToken

Além disso, os especialistas ouvidos pelo BeInCrypto Brasil avaliam que a medida atrapalha o desenvolvimento tecnológico do País ao desincentivar o investimento em estruturas tokenizadas.

“O Brasil é pioneiro em inovação no sistema financeiro. O Pix e o DREX são iniciativas que levaram o País ao patamar de liderança em inovação financeira. Mas, agora, todo esse avanço se encontra ameaçado por uma decisão política que não levou em conta os impactos macro para o país”, diz Regina.

Em 2024, a pesquisa Global Crypto Adoption Index, da Chainalysis, elencou o Brasil na 9ª posição mundial na inclusão digital e na nova economia. Além de liderar os países do G20 em adoção e inovação, os brasileiros recorriam cada vez mais a stablecoins para remessas e proteção cambial.

Durante a Febraban Tech 2025, executivos de bancos e fintechs se pronunciaram sobre a taxação das criptos. “Sob a ótica do cliente, nós do Itaú ainda vemos muitas dúvidas. Eu acredito que com a nova MP o universo de criptoativos já é visto como um segmento muito relevante”, disse Guto Antunes, head da Itaú Digital Assets .

“É preciso clareza, mas é [cripto] um ativo como qualquer outro, se você teve lucro, vai ser tributado como qualquer outro ativo”, comenta Silvio Pegado, managing director of Latin America da Ripple.

O governo federal coloca stablecoins no balaio de investimentos

Além disso, a medida aprovada pelo governo federal coloca no mesmo quadrante stablecoins e criptomoedas de investimento. Apesar de parecidas, a finalidade de cada uma é distinta.

Enquanto as criptomoedas de investimento, como Bitcoin, Ethereum e Solana, são o objeto final na transação de um investidor, a stablecoin, no geral, é só o meio de pagamento tokenizado . Em um cenário em que a regulamentação ainda não saiu do papel, essa falta de definição é ainda mais complexa.

“Os stablecoins são muito mais utilizados para operações de pagamento do que em investimentos. Isso gera um impacto gigantesco em operações de fintechs e empresas de pagamento que utilizam as tecnologias de blockchain para fazer pagamentos globais”, explica Carlos.

IOF ou Imposto de Renda: de onde vem essa cobrança?

As criptomoedas entraram na polêmica sobre o IOF desde que o começo de junho. Porém, pela letra da lei, apenas transações de câmbio, empréstimos, seguros e valores imobiliários são taxados pelo IOF. Portanto, não se aplica as criptomoedas, que possuem uma variação na denominação , o Bitcoin, por exemplo, pode até ser considerado como commodity.

“Quando você utiliza uma stablecoin, isso não é considerado um valor imobiliário, o que seria o mais próximo do IOF. Para que possamos aplicar o IOF nos criptoativos, iriamos precisar de uma nova lei para alterar essas categorias”, comenta Carlos.

Quais os próximos passos da taxação?

O Congresso tem 120 dias para aprovar a medida e torná-la definitiva. Para além de taxar as criptos, a MP também revoga a isenção de IR para LCI e LCA . Ao mesmo tempo, a MP aumenta a alíquota sobre Juros sobre Capital Próprio (JCP) e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), o que atinge fintechs, gestoras e plataformas que operam com criptoativos.

“Eu não gosto do que eles tão fazendo e espero que eles derrubem. O governo está em uma caça para aumentar o capital, a arrecadação, para poder tapar os buracos que existem aí com todos os gastos do governo brasileiro, que é gigantesco. Tem questões ainda em aberto que precisam ser avaliadas, ajustadas, eu preferiria que fosse aberto para o público discutir”, diz Luiz Parreira.

Após consultar uma assessoria de relações governamentais, a ABToken avalia o que pode ser feito para retroagir com a tramitação.  “Vamos acompanhar em Brasília, junto aos políticos, os desdobramentos e devemos adotar ações estratégicas para entender os impactos negativos para a população e para o mercado. Neste momento é importante a mobilização de todos o setor”, diz Regina.